Porque Fedora?

Já dissertei sobre o que acho do Fedora para iniciantes, mas aqui vou falar sobre o que acho do Fedora para quem já é usuário de alguma distro Linux de desktop e possíveis motivos para se querer usar a distribuição ou se envolver com o projeto.

Vale lembrar que algumas características aqui não são exclusivas do Fedora.

Mantido pela comunidade + Red Hat

Fedora is a community; Fedora Linux is our OS – Fedora Community Blog

Ser mantido pela comunidade significa que membros do conselho / core do Fedora eleitos pela comunidade, tomam certas decisões no projeto.

Isso significa também que dificilmente (não é 100% indiferente ao mercado) alguma tendência do mercado irá afetar o rumo do projeto, como talvez você já tenha visto em outras distros mantidas por empresas. Por questões de custos e tendências comerciais, DE’s / softwares que muitos gostaram / investiram / contribuíram… já foram abandonados (não falo do Fedora neste caso).

Softwares podem ser abandonados em qualquer lugar, mas as chances de isso acontecer quando um projeto é muito ligado ao upstream ou tem uma comunidade de desenvolvimento sólida e comprometida é menor (vou falar sobre o termo “upstream” mais pra frente).

Em outras palavras, não é totalmente “pro interesse corporativo / comercial”.

O líder do Projeto Fedora (Mattew Miller) já explicou que as maiores contribuições da Red Hat ao projeto é pesadamente ligada a questões de engenharia de software e infraestrutura.

Membros do projeto podem criar / propor mudanças que poderão impactar a todos. Estas propostas podem ser discutidas, avaliadas, estudadas e talvez aceitas em uma próxima versão do Fedora. Algo que talvez não poderá fazer em uma distro mantida por uma empresa, pois as propostas terão que ser compatíveis com os planos da mesma, que nem sempre são públicas.

Mas o que isso tem haver com você que não tem capacidade técnica para criar ou propor uma mudança ao projeto?

A resposta está no que falei anteriormente, as propostas serão mais “pro tecnologia” ou “pro comunidade” e mais compatíveis com os objetivos e propostas do projeto, que são totalmente públicas e transparentes na documentação/site do projeto.

Serão menos “pro tendência do mercado” ou “pro interesse corporativo”, pois nem sempre o que é tendência do mercado poderá ser bom para o projeto ou usuários. Com sorte, as vezes as coisas andam juntas.

O projeto poderá não agradar em algumas decisões em alguns momentos, mas digo que isso é para uma minoria que não está bem alinhada com os objetivos do mesmo, outro motivo é que o projeto ainda é feito por pessoas, que podem errar…

Resumindo, uma das características é a transparência em todo o processo que envolvem manter o projeto.

Upstream first

Este tópico se encaixa bem “F” de “first”

Talvez seria necessário um artigo apenas sobre este termo “upstream first”, mas vou me esforçar.

O Fedora tenta ao máximo (pois nem sempre é tão fácil) estar alinhado com o upstream / princípios do projeto, ou seja, tenta oferecer uma experiência mais próxima ao que os desenvolvedores oferecem (mesmo tendo pessoas que são up/downstream ao mesmo tempo). Talvez você conheça isto por “software vanilla”.

Ser “upstream first” também é uma forma de reconhecer o trabalho alheio e gerar contribuição nos dois sentidos, tanto para quem desenvolve quanto para quem distribui.

Uma distribuição pode não oferecer a experiência mais próxima do upstream, mas ainda pode ser considerada “upstream first” se manter uma boa relação de contribuição com o mesmo.

Exemplo do EndlessOS e elementaryOS que contribuem e tem boa relação com o GNOME mesmo não oferecendo o GNOME desktop vanilla.

Uma parte da documentação do Fedora:

“O Projeto Fedora se concentra, tanto quanto possível, em não se desviar do upstream no software que inclui no repositório. As diretrizes a seguir são um conjunto geral de melhores práticas e fornecem razões pelas quais esta é uma boa idéia, dicas para enviar seus patches para o upstream e exceções potenciais que o Fedora pode fazer. O objetivo principal é compartilhar os benefícios de uma base de código comum para usuários finais e desenvolvedores, reduzindo simultaneamente os esforços de manutenção desnecessários.

upstream (substantivo). Em projetos de código aberto e gratuito, o upstream de um programa ou conjunto de programas é o projeto que desenvolve esses programas. O Fedora é o downstream desses projetos. Esse termo vem da ideia de que a água e os bens que ela carrega flutuam rio abaixo e beneficiam quem está ali para recebê-la.

to upstream (verbo). É uma forma abreviada de dizer “manda a mudanças para os desenvolvedores do software”.”

Esta parte é interessante que fala do “porque mandar as mudanças para o upstream”

“Benefício comum e carga de manutenção reduzida: Quando o Fedora carrega patches que são específicos para o Fedora ou desvios de projetos upstream, esses patches não são compartilhados por todas as distribuições. Isso coloca o fardo de manter esses patches no Fedora, o que inclui mantê-los em um estado funcional reescrevendo ou encaminhando-os para cada versão upstream. Esse esforço pode rapidamente tornar-se opressor, embora não esteja no espírito de compartilhar os benefícios (bem como o esforço para manter) o software livre e de código aberto.”

Em palavras de um desenvolvedor GNOME (Georges Stavracas):

“Upstream first é um estilo de vida”

Como falei, no Fedora muitas vezes o Upstream (dev do programa) também é o Downstream (mantenedor do programa no Fedora).

Pro tecnologias atuais / modernas e com potencial

Distribuição Fedora Linux 35 pretende utilizar o WirePlumber para gerir o  PipeWire - SempreUpdate

Este tópico se encaixa bem “F” de “features”

Não é porque é novo que estará no Fedora, falei sobre propostas anteriormente e nelas surgem as mudanças com as novas tecnologias.

As propostas precisam ser consistentes e de certa maneira “convencer” tecnicamente que ela está de acordo com todas as políticas internas do projeto, se tiver upstream envolvido melhor ainda!

Usei a palavra “potencial” pois as mudanças não são tratadas como eternas, existe um plano B, caso precise reverter a mesma.

Se a mudança em questão é de algum software com muito potencial e a proposta de mudança é sólida, porém ainda não atingiu o seu “ápice” de desenvolvimento, o Fedora poderá ajudar ou impulsionar este software incluindo no seu repositório ou até no OS por default, isso pode gerar mais atenção e acelerar o desenvolvimento do mesmo, exemplo recente do Pipewire.

Aconteceu o mesmo com Wayland e muitas outras coisas que hoje todas distribuições estão usufruindo.

Então o Fedora inclui tecnologias que não estão “prontas” ou que são instáveis?

Veja também o artigo sobre “Atualizações e tempo de suporte”

Este tipo de pergunta tem um viés e parte da premissa que um OS só pode ser estável ou pronto para uso se congelado por anos, que vem de marketeiros da internet / “enterprise business” / sistemas LTS’s, também chamadas de “OLD Stable” ou como gosto de chamar ” OS congelados”. Não sou contra ou acho errado sistemas congelados, entendo que existe motivos para existirem, só não acho que são compatíveis com a realidade dos desktop’s hoje em dia, ainda que possam suprir a necessidade de alguns casos de uso.

Sobre este assunto, recomendo um artigo do Richard Brown (engenheiro da SUSE) que aborda mais esta questão de sistemas LTS / versionamento / rolling release…

Como falei anteriormente, nas propostas do Fedora incluem um “plano B” isso geralmente é uma maneira de reverter a mudança caso precise (sistemas OSTree estão um passo a frente nesta questão de rollback).

Como o Fedora tem esta tendência “upstream first” e ser “pro desenvolvimento tecnológico” isso inclui dar o primeiro passo, na qual nem sempre é acertado ou é perfeito. Mas o que importa aqui é o efeito colateral quando feito de maneira responsável.

Em outras palavras, ele pode incluir softwares que não estão bem maduros, mas não deixará o usuário “na mão” você poderá escolher reverter a mudança, mas terá que ser uma atitude sua, pois por padrão o Fedora seguirá a sua tendência natural como projeto, então cabe a você estar sincronizado ou não com as escolhas.

Então você não precisa necessariamente abraçar todas mudanças no momento de lançamento de cada versão. Eu costumo dizer que você ainda tem pelo menos 7 meses para esperar e avançar de versão no Fedora (pois é geralmente nos lançamentos que ocorrem grandes mudanças).

Vai muito além de uma .iso

Este artigo é justamente para você que já não está vendo estes projetos / OS’s / distribuições como “refisifuques” de fundo de quintal, que oferecem apenas .iso’s que você baixa de grátis!

O que percebo de alguns distro hopper’s que baixam o Workstation (a principal com GNOME) e acham que esta é a “experiência definitiva do Fedora”. No título está “Fedora Linux” pois isto abrange todo o Fedora como software também.

O projeto incentiva a criação de Spins, Labs, versões emergentes e até mesmo você montar o sistema no estilo Arch Linux. Então creio que deveriam, pelo menos, fazer um “distro hopping” por dentro do projeto antes de resumir o Fedora Linux como “Fedora com GNOME”.

Por consequência de sua grande comunidade e outras características de incentivo a tecnologias, nascem coisas como o Silverblue e Kinoite. Que são basicamente o “futuro do desktop Linux”, sendo ou não o futuro, você já consegue por a prova, testar, conhecer agora mesmo e isso não é qualquer projeto que consegue.

GNOME

Não dá para deixar de falar da “integração do GNOME” onde o Fedora dá mais atenção, ou pelo menos, existe mais pessoas relacionadas ao GNOME dentro do projeto, então é natural que receba mais atenção.

A comunidade em geral, reconhece que a experiência do GNOME no Fedora é uma das melhores, além do fator citado acima, inclui acompanhar de forma mais sincronizada os lançamentos do Fedora/GNOME, oferecer versões em desenvolvimento no canal Rawhide, além de oferecer uma experiência mais coesa com poucas ou nenhuma modificação.

Relacionamento com Nvidia e fornecedores de hardware

Fedora and Lenovo at Red Hat Summit

Nvidia não tem um bom relacionamento com as tecnologias do desktop Linux em geral, logo pode não ser tão amigável como poderia ao Fedora. Mas isso não quer dizer que a distro não se preocupa com a experiencia do usuário com estas placas de video.

Existe engenheiros trabalhando junto a Nvidia reportando e tentando melhorar a experiencia como um todo no Linux, mas quando se trata de software fechado, depende muito mais da velocidade e interesse do proprietário deste software para resolver problemas, algumas coisas dependem de atualizações de outros softwares open source também, que nem sempre tem prioridade com Nvidia, afinal, se você tem outros drivers gráficos open source trabalhando de forma mais sincronizada e colaborativa, você daria prioridade para o driver fechado ou aberto?

Com o estilo “upstream first” o Fedora não costuma criar gambiarras downstream para mitigar falta de integração de drivers proprietários com softwares open source.

O Red Hat (que é sempre baseado em alguma versão antiga do Fedora) possui certificação com alguns equipamentos da DELL e Lenovo. Atualmente, Lenovo é mais ativa com o projeto Fedora e seus engenheiros proporcionando driver’s de forma upstream, sem .iso dedicadas para seus hardwares específicos, o que trará compatibilidade para todas distros Linux.

Pro Open Source

News | Open Source Initiative

Este tópico se encaixa bem “F” de “freedom”

No Fedora só encontrará softwares open source nos repositórios oficiais, não é por uma questão “religiosa” (como no GNU?) mas por questões legais, de qualidade técnica, licenças, segurança… Não é apenas por ser open que o software estará no Fedora.

Eu sei que ainda existe uns religiosos por aí, mas isso é consequência de ser um projeto grande e antigo.

Para se ter uma pequena noção do tamanho do Fedora veja este artigo.

Isso pode gerar um pouco de barreira a novatos que buscam experiência ootb, para se instalar um driver proprietário Nvidia por exemplo, tendo que adicionar um repositório (RPMFusion) na qual é mantido por contribuidores do Fedora, porém em domínios separados por questões legais.

Poderia ser muito pior! já ouviu falar das distros recomendadas pela FSF?

O Fedora abre exceção para firmwares de WIFI, bluetooth e outros, oferecendo por default e em seus repositórios, dessa maneira raramente algum hardware exótico ou de suporte duvidoso, pedirá driver de repositórios de terceiros.

Para app’s de código fechado ou que não estão nos repositórios as soluções via Flatpak é o recomendado pelo projeto.

Você pode até questionar como isso não é tão “user friendly” mas não pode negar que a receita do bolo vem dando certo. O projeto já existe a quase 2 décadas, com mais de 200 mantenedores, oferecendo um sistemas de qualidade e a maior empresa de software open source patrocinando ativamente entre muitos outros feitos que beneficiam toda a comunidade Linux.

Comunicação / suporte

Ask Fedora - Ask anything about Fedora!

Este tópico se encaixa bem “F” de “friends”

O projeto possui vários meios de comunicação, que vão a Twitter, Reddit, bugtracker, foruns, Telegram, redes Matrix, mailing lists…

Não é difícil encontrar ajuda e informações na internet (embora no Brasil poderia ser melhor) e em vários meios de comunicação, que podem ser escolhidos por sua facilidade em compreender, por conhecimento técnico, preferências etc…

Quer fazer perguntas em um fórum para o público geral?

https://ask.fedoraproject.org

Já tem algum conhecimento e quer discutir coisas mais técnicas ou mais focada para desenvolvimento?

https://discussion.fedoraproject.org

Canal de comunicação (mailing list) onde geralmente verá anúncios de propostas de mudanças em conjunto com as discussões sobre o projeto, tendo categorias para dev / users / test / kde…

https://lists.fedoraproject.org/archives

Acompanhar via Twitter?

Comunidade Reddit?

Acompanhar notícias via canal no Telegram?

https://telegram.me/fedoranews

Grupo brasileiro no Telegram?

https://t.me/comunidadefedorabrasil

Grupo BR sobre Fedora OSTree?

https://t.me/fedorasilverblueportugues

Existe muitos outros por aí e provavelmente encontrará Fedora user’s em outros fóruns relacionados a Linux em geral.

Os meios comunicação também ajudam na transparência do projeto, pois dificilmente você terá alguma “surpresa” sobre decisões, na qual geralmente são bem discutidas publicamente antes.

Atenção! o Fedora não possui uma central de atendimento ao cliente, não vendem produtos ou serviços. Não trate a comunidade como servos das suas necessidades, você não é um “cliente”.

Recomendação: Artigo do Diolinux sobre Fedora para iniciantes?

Conclusão

Creio que explorei um pouco mais além dos 4F’s do Fedora, adicionando minha experiência e percepção sobre o projeto depois de anos usando diariamente, interagindo com outros usuários / contribuidores, contribuindo no que posso, aprendendo e tentando ensinar o pouco que sei.

Se deseja me dar sugestões, mande para fastos2016@gmail.com ou nas redes sociais.

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